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A legislação japonesa sobre IA deixa lições para o Brasil

15 de junho de 2025

Enquanto o debate sobre a regulamentação da inteligência artificial (IA) segue em ritmo lento no Congresso Nacional brasileiro, o Japão avança com uma proposta concreta.

O país asiático já possui uma legislação praticamente pronta, com poucas etapas burocráticas separando o texto de sua implementação oficial.

Curiosamente, a abordagem japonesa se afasta dos modelos mais restritivos vistos na União Europeia e nos projetos de lei em tramitação no Brasil.

Em vez de impor proibições ou limites rígidos, a nova legislação japonesa parte do princípio de que a IA é essencial para país.

“A tecnologia é fundamental para o crescimento da economia e da sociedade japonesa”, aponta o texto da nova lei.

Por isso, a norma estabelece mais incentivos do que restrições para empresas e serviços que trabalham com inteligência artificial, priorizando a promoção da inovação no setor privado.

Ao contrário das propostas brasileiras e europeias — que classificam sistemas de IA por grau de risco —, o Japão optou por uma regulação baseada em recomendações, princípios e diretrizes éticas.

“Não há um modelo punitivo definido. Caso alguma empresa infrinja as diretrizes, o governo realiza uma investigação e orienta a organização a atuar de forma ética”, explicou o advogado André Gualtieri.

A responsabilização em caso de uso indevido da tecnologia será feita com base no Código Penal e nas leis já existentes, como as de direitos autorais.

“É quase como uma advertência, sem sanções automáticas ou punitivismo excessivo”, conclui Gualtieri.

Esse modelo “amigável” de regulação levanta dúvidas sobre os motivos por trás da escolha.

Embora o governo japonês não tenha declarado oficialmente, analistas apontam a situação econômica instável como um fator decisivo.

O país enfrenta uma retração econômica preocupante. O Produto Interno Bruto (PIB) encolheu 0,7% entre janeiro e março de 2025, em comparação ao mesmo período do ano anterior.

Além disso, o Banco Central manteve os juros em 0,5%, mas não conseguiu conter a inflação de alimentos e energia, agravada pela desvalorização do iene.

Outro ponto de alerta foi o desempenho das exportações, que ficaram abaixo do esperado em abril. A queda foi atribuída às incertezas causadas pelas tarifas anunciadas pelo governo de Donald Trump nos Estados Unidos.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê uma recuperação gradual da economia japonesa, com crescimento entre 1,2% e 2,5% em 2025 — desde que o setor privado reaja de forma positiva.

Diante desse cenário, investir em tecnologia e inteligência artificial aparece como uma estratégia para reaquecer a economia.

No entanto, o Japão percebeu que estava ficando para trás nesse campo. De acordo com o relatório 2025 AI Index Report, da Universidade de Stanford, o setor privado japonês investiu US$ 930 milhões em IA em 2024.

Apesar do valor parecer significativo, ele representa apenas uma fração do que foi investido por outros países.

Os Estados Unidos lideraram com US$ 109 bilhões aplicados em IA, seguidos pela China com US$ 9,29 bilhões. Países vizinhos, como a Coreia do Sul, também superaram o Japão nesse aspecto.

Uma pesquisa encomendada pelo governo japonês em 2024 revelou que apenas 9% da população e 47% das empresas utilizavam ferramentas de IA generativa.

A baixa adesão foi atribuída à ausência de uma base legal que oferecesse segurança jurídica para o uso da tecnologia.

Nesse contexto, o governo japonês optou por uma legislação que promove liberdade e confiança nas empresas, sem abrir mão de princípios como transparência, responsabilidade e cooperação.

“A legislação reflete a cultura e os aspectos jurídicos do país. Trata-se de uma regulação baseada em diretrizes, não em sanções”, pontuou Gualtieri.

No Brasil, apesar da lentidão, houve um pequeno avanço. No último dia 10 de junho, a comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa o Projeto de Lei 2338/23 anunciou a realização de uma audiência pública para discutir a regulação da inteligência artificial.

O encontro contará com a participação de representantes de setores afetados pela IA, como dubladores, quadrinistas, gravadoras e artistas — incluindo a cantora Anitta.

A escalação pouco convencional indica o interesse em debater os impactos da tecnologia na cultura e nos direitos autorais, embora a tramitação legislativa siga em ritmo lento.

Enquanto o Japão escolhe confiar nas empresas e priorizar o crescimento econômico, o Brasil segue cauteloso, buscando equilibrar inovação com proteção de direitos.

O resultado dessa diferença de abordagem ainda está por ser avaliado.

Por Redação i9Brasil

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