O Marco Civil da Internet e a Liberdade de Expressão
Por: Maurício Figueiredo* – professor da UEA e pesquisador nas áreas de Internet das Coisas, Sistemas Inteligentes, Aprendizado de Máquina Profundo, entre outros.
O Marco Civil da Internet (Lei 12.965, de 23/4/2014) é uma Lei que foi discutida durante 7 anos, com representação popular e aprovada em 2014 pelo legislativo. Ele estabelece em seu artigo 19 que há necessidade de um processo legal para o controle de conteúdos abusivos e indevidos, sendo o provedor responsabilizado apenas no caso de descumprimento de decisão judicial. Seu objetivo é a proteção à liberdade de expressão.
Sem o artigo 19, denúncias arbitrárias poderiam forçar provedores a censurar conteúdos sob pena de punição, individualizando a decisão sobre o que é lícito ou não nas redes. Os publicadores de conteúdo também poderiam se sentir prejudicados pela censura prévia, o que criaria um caos jurídico e insustentável para os provedores. O problema é que, sob risco, certamente a balança penderia para o lado dos detentores de algum tipo de poder econômico, jurídico ou político.
A proposta de alteração do Marco Civil, dez anos após sua implementação, surge em um contexto de descentralização da informação, onde a voz não está mais concentrada em poucos veículos de comunicação. Nas redes, qualquer um tem voz e é muito mais difícil controlar a todos. Então, a mudança almeja transferir a responsabilidade do conteúdo para os provedores, tornando-os mais suscetíveis a pressões e resgatando um controle centralizado.
Contudo, essa medida demonstra-se ineficaz, uma vez que a natureza descentralizada da Internet permite o fácil contorno de bloqueios, com a criação de novas contas, migração para outras redes e uso de ferramentas como VPNs e redes criptografadas. Vivenciamos isso recentemente com a suspensão do X, que causou o aumento expressivo de usuários em plataformas como Bluesky e Threads. Além disso, avançar mais nessa tentativa de controle remeteria a modelos como o “Great Firewall” chinês, com o monitoramento massivo de conteúdos e bloqueio amplo de sites, principalmente, das redes sociais. Isso limitaria drasticamente o acesso à informação e levantaria maiores questionamentos sobre democracia e liberdade de expressão. Ainda, isso empurraria cada vez mais pessoas para os confins da “Deep Web”.
Liberdade de expressão não é liberdade de agressão, claro! Mas o Marco Civil não impede a punição do agressor. Em vez de censura, o combate à desinformação deve ser feito com mais informação e transparência, utilizando tecnologia e um sistema judicial mais ágil e justo. A iniciativa de um poder em regular individualmente a liberdade de expressão na internet levanta preocupações, ignora a sociedade e a competência de outros poderes. Por fim, é melhor lidar com uma mentira que pode ser desmascarada do que com uma verdade que jamais será revelada. Vamos Pensar Nisso!
*Maurício Figueiredo é Professor associado da Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Estado do Amazonas (EST/UEA), co-fundador do LSI – Lab. de Sistemas Inteligentes da UEA, pesquisador do Ocean Center, professor da pós-graduação em Ciência de Dados da UEA e professor colaborador do Programa de Pós-graduação em Informática da Universidade Federal do Amazonas. Engenheiro Eletricista pela Universidade Federal do Amazonas, mestre e doutor em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Tem experiência na execução e gestão de projetos de P&D em parceria com empresas e projetos acadêmicos na área de Computação. Atua em temas relacionados a Internet das Coisas, Sistemas Inteligentes e Aplicações de Aprendizado de Máquina Profundo.