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Quem conectou a Amazônia foi Elon Musk

13 de outubro de 2023

Por Maurício Figueiredo*, professor da UEA e pesquisador nas áreas de Internet das Coisas, Sistemas Inteligentes, Aprendizado de Máquina Profundo, entre outros.

Barcelos, cidade amazonense situada a 405 km de Manaus, integra o mapa turístico brasileiro ao oferecer um conjunto de arquipélagos que encanta os turistas que visitam o local. Frequentemente, recebe estrangeiros e brasileiros interessados em turismo de pesca ou de aventura, por exemplo, servindo de base para expedições ao Parque Nacional do Aracá, de belíssimas paisagens, cachoeiras e biodiversidade. A segunda maior cidade brasileira em extensão territorial, possui população de aproximadamente 19 mil habitantes, com agricultura de subsistência, tem importante atividade econômica baseada no turismo e na exportação de peixes ornamentais. Tudo isso com uma conectividades deficiente e alvo frequente de reclamações.

Para toda a região amazônica, tem-se no turismo a mais promissora alternativa sustentável de desenvolvimento sem prejuízos ao meio ambiente. É sabido que tal atividade poderia ser vetor de emprego e renda para o povo que aqui vive, mas as ações para melhoria de visitantes ainda conta com iniciativas incipientes, tanto do poder público, como da iniciativa privada. Essa deficiência de infraestrutura se exemplifica na limitada cobertura e precária qualidade de acesso à Internet nos municípios amazonenses, avalie então nas comunidades dispersas em gigantescas áreas territoriais somente acessíveis por dias de viagens de barco.

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Hoje, é impensável receber turistas sem uma Internet de qualidade, seja para mantê-lo comunicável, por uma questão de conforto e segurança, seja para que o mesmo publique suas fotos e stories nas redes sociais, algo frequente na cultura digital da atualidade, e que atrairá mais turistas. Além disso, como o povo local se educará, criará empreendimentos e divulgará seus produtos e serviços sem conectividade adequada? Há mais de 20 anos falamos de inclusão digital como fator para democratização da tecnologia, elevação dos índices educacionais e de qualidade de vida, e vimos tão poucos e lentos avanços na região.

Pois, em maio de 2022, a situação começou a mudar com a chegada ao Brasil da Starlink, serviço de acesso à internet via satélite da SpaceX, do bilionário Elon Musk. Com custo similar ao de qualquer outro serviço de Internet, hoje, os barcos que transportam turistas entre a capital e Barcelos oferecem acesso à Internet ininterrupto a taxas de dados de 200 Mbps, o que antes só era possível perto das zonas urbanas com cobertura celular. Hoje, uma família de ribeirinhos que cuida da reserva do Sauadaua, próxima a comunidade Imã, a 100 km de Barcelos, consegue assistir ao jornal e se comunicar via Zap com amigos e parentes, quando antes viviam meses isolados na floresta. Segundo dados da Anatel, já são mais de 67 mil clientes Starlink no Brasil, sendo 21 mil apenas na Região Norte.

O que proporcionou essa alternativa foram duas inovações muito interessantes. Primeiro, a criação de uma plataforma formada por uma malha de satélites de baixo custo e alto desempenho ao redor da Terra, proporcionando que pequenos transceptores e antenas localizadas em praticamente qualquer local com energia elétrica, possam usá-la para acessar a Internet. Tem-se, assim, o serviço da Starlink. E segundo, a criação de uma empresa espacial (SpaceX) que construiu um foguete capaz de lançar objetos no espaço e voltar para ser reaproveitado, diminuindo drasticamente os custos da operação. É indiscutível que essa inovação da empresa de Elon Musk é algo que a NASA não fez.

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É claro que existem esforços do Estado no objetivo de conectar a Amazônia. Cito aqui a operação de guerra do Exército brasileiro, o Projeto Amazônia Conectada, para instalação subaquática de cabos de fibra óptica nas principais cidade das calhas do Rio Negro e Solimões. Já são 2 mil km de cabos conectando 9 cidades, segundo site oficial. Mas veja como fica inviável para um projeto que iniciou em 2014, conectar todos os 62 municípios do maior Estado brasileiro. Ainda, o atual Governo Federal lançou uma portaria pelo Ministério da Educação para conectar 160 mil escolas públicas em todo o Brasil, até 2026, com velocidade mínima de 50 Mbps. É o programa Estratégia Nacional de Escolas Conectadas. Mas veja que curioso: 40 mil dessas escolas não estão em locais atendidos por fibra óptica, principalmente nas regiões nordeste e norte do país. Nenhuma empresa, hoje, conseguiria atender esse plano, nem empresas privadas que operam por satélite, tampouco a Telebrás. Somente a Startlink seria capaz de atender esses requisitos no prazo pretendido.

Obviamente, que a existência desse novo serviço não deve cessar todo e qualquer esforço governamental e privado de conectividade da Amazônia. Hoje, o acesso à informação pela Internet é questão de soberania e proteção ao meio ambiente. Então, vamos lançar mais fibras, vamos acelerar esse processo, vamos buscar alternativas tecnológicas. Mas enquanto o tempo passa, vamos navegando pelos rios e pelas redes do Elon Musk.

*Maurício Figueiredo é Professor associado da Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Estado do Amazonas (EST/UEA), co-fundador do LSI – Lab. de Sistemas Inteligentes da UEA, pesquisador do Ocean Center, professor da pós-graduação em Ciência de Dados da UEA e professor colaborador do Programa de Pós-graduação em Informática da Universidade Federal do Amazonas. Engenheiro Eletricista pela Universidade Federal do Amazonas, mestre e doutor em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Tem experiência na execução e gestão de projetos de P&D em parceria com empresas e projetos acadêmicos na área de Computação. Atua em temas relacionados a Internet das Coisas, Sistemas Inteligentes e Aplicações de Aprendizado de Máquina Profundo.

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